sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Do clássico ao pop


Por Gabriel Albuquerque


Crítico musical da célebre revista americana The New Yorker, Alex Ross ganhou fama de um modo bastante inusitado. Em 2007, lançou O Resto é Ruido, que traça um panorama em modo cronológico a história da música erudita do século XX, descrevendo e narrando os principais movimentos surgidos no período, e o livro tornou-se best-seller e um ótimo guia para os ouvintes leigos, mas curiosos, iniciarem suas aventuras no multifacetado repertório clássico.
Na esteira do sucesso de O Resto é Ruído, Ross lançou em 2010 (com tradução e lançamento no Brasil em 2011, pela Companhia das Letras) Escuta Só, o seu segundo e bastante elogiado livro.

A história de ouvinte de Ross é, no mínimo, curiosa. Filho de pais apaixonados e colecionadores de discos de música erudita, ele passou infância e adolescência imerso no repertório clássico. Aprendeu a tocar piano (com o qual tentou levantar uma carreira musical, mas admitiu não ter o talento requisitado) e dedicou-se à estudos calorosos sobre compositores clássicos. Seu encontro com o pop só veio acontecer na faculdade, quando começou a fazer amizades roqueiras/punk e comprou uma compilação do Pere Ubu e o álbum Daydream Nation, do Sonic Youth. ''Minha fortaleza musical desmoronou'', conta.

Essa experiência, somada aos 16 anos de experiência como crítico da New Yorker (ele assumiu o posto com apenas 28 de idade) fez com que Ross lapidasse seus textos de um modo mais acessível aos ouvintes não familiarizado com os jargões eruditos. Sua formação em História também reflete em seus artigos, que misturam o ensaio, a crítica e a reportagem e com leves aulas de teoria musical. São dotados de uma linguagem jornalística límpida, clara e cheia de conexões com o popular, sendo acessível a todos, mesmo que você nunca tenha ouvido falar em Esa-Pekka Salonen.
Foi justamente essa abordagem mais direta e direcionada ao contexto histórico e a emoção da música que deram o sucesso à O Resto é Ruido e Escuta Só, uma coletânea de textos publicados na New Yorker.

Em seu segundo livro, Alex Ross sai mais de sua zona de conforto e escreve perfis apaixonados sobre artistas pop de vanguarda, como a banda inglesa Radiohead e a cantora islandesa Björk e o americano Bob Dylan, e divide um capítulo para gente como Kiki & Herb, Sonic Youth, Cecil Taylor, Frank Sinatra e Nirvana. Ao falar sobre Kurt Cobain, causa polêmica ao dizer que o pop não é o melhor meio para declarações políticas. Você pode até descordar, mas é uma questão a ser debatida.

De volta ao âmbito clássico, Ross traça biografias rápidas, mas coesas e eficientes, dos austríacos Schubert e Mozart, sendo que a música deste último recebe maior destaque do que o primeiro. Para provar que o clássico não vive apenas do passado, o autor faz uma interessante e empolgante análise da atual cena musical da China.

Entre outros momentos altos, estão o primeiro capítulo, onde Ross já se apresenta destruindo as barreiras entre o clássico e pop; um ensaio onde mostram as consequências e negativas da interferência dos avanços tecnológicos sobre a música e o curioso capítulo sobre o Esa-Pekka Salonen, onde conta não só a história do maestro da Filarmônica de Los Angeles, mas a importância dessa figura no funcionamento de uma orquestra.

Sem a intenção de soar enciclopédico ou guia definitivo e detalhado, Escuta Só pode tirar os preconceitos de qualquer um sobre a música erudita, e consequentemente, uma ótima porta de entrada para o gênero. Afinal de contas, como diria o próprio Alex Ross, música é algo que vale a pena amar.

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